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Sommet mondial sur la société de l'information
World summit on the information society
Genève 2003 - Tunis 2005

 

Repensar a inclusão digital

Análise por Adelaide Leocádio, Açores, Portugal
Estagiária Eurodisseia - Assembleia das Regiões Europeias

09.06.2004

 

Sommet mondial sur la société de l'information, Genève, décembre 2003  
1. Principais linhas de convergência em Geneva

Nos úlimos anos o mundo tem passado por grandes e aceleradas transformações económicas, sociais e culturais. Os tradicionais modelos de organização sócio-económica, tais como, as grandes burocracias públicas e privadas, o Estado de bem-estar social, a radiodifusão centralizada e o mercado do consumo de massas foram alterados por novos sistemas produtivos, descentralizados e clientalizados, pela desmontagem dos sistemas de protecção social, por novos meios de comunicação de massas, por novas formas de organização social.

Vários teóricos têm atribuído a grande responsabilidade destas transformações à revolução das tecnologias da informação e da comunicação e ao impacto que elas têm tido em todas as esferas da sociedade.

A Sociedade da informação está a nascer e com ela novos desafios. Todas as mudanças que ela acarreta são profundas e irreversíveis. É, pois emergente a definição de um novo projecto político que encaminhe tais mudanças para um rumo economicamente mais equitativo, socialmente mais justo e politicamente mais democrático.

O encontro em Geneva serviu, essencialmente para pôr em comum propostas, ideias e desafios para a construção desta “nova sociedade”, permitindo também fazer um esboço da situação actual das Tecnologias da Informação e da Comunicação pelo mundo.

Como era de esperar, a questão das assimetrias no acesso e uso das TIC foi um assunto, frequentemente mencionado nas declarações de muitos países. O nível de desenvolvimento das TIC e o grau de envolvimento da população com as mesmas são, sobretudo nos PED muito deficitários. A maior parte dos PED ficaram visivelmente à margem da “revolução” das TIC, o que conduziu ao que se tem hoje chamado de “fractura numérica”. Para estes países o risco é grande – as desigualdades já existentes podem tornar-se ainda mais gritantes.

O desenvolvimento das TIC é, nestes países, dificultado pela situação sócio-económica que apresentam. De uma maneira geral, a pobreza é o maior problema dos PED. Ela traduz-se não apenas na falta de recursos financeiros, mas também no difícil acesso à educação, aos cuidados de saúde, ao emprego, aos serviços, às infraestruturas, etc.

Ainda que seja difícil avaliar o efeito das TIC, elas têm a capacidade de melhorar a qualidade de vida das populações mais pobres. A maioria dos economistas estão em acordo relativamente à ideia de que as novas tecnologias da informação e da comunicação tornaram-se um vector cada vez mais importante no crescimento económico. Na conferência de Geneva sobre a Sociedade da Informação e da Comunicação os participantes fizeram, várias vezes alusão a esta linha de pensamento. Lá foi sublinhado que uma melhor difusão do saber poderá funcionar como uma rampa para assegurar a inserção dos PED na economia mundial e acelerar o crescimento económico graças aos ganhos de produtividade.

O encontro que reuniu representantes de 150 países mostrou que é já tempo de pensar em como a Sociedade da Informação pode beneficiar todos. Foi importante para estabelecer regras comuns, afim de assegurar que a sociedade, na sua globalidade, possa aceder e usar a tecnologia de um modo que consiga dela tirar o máximo potencial para um desenvolvimento mais equitativo dos povos.

As ideias centrais relativas aos discursos de todos os países participantes na Cápsula situam-se, essencialmente em dois eixos – o eixo da tecnologia e o eixo da pessoa humana. O primeiro refere-se a todos os aspectos técnicos que concorrem para a construção de uma Sociedade da Informação para todos e o segundo aos aspectos sociais, culturais e morais dos povos.

No eixo da tecnologia as manifestações foram muito significativas. Parece haver, de uma maneira geral, o consenso de que as TIC promovem e incrementam o desenvolvimento económico e contribuem para melhorar o nível de vida dos indivíduos. Foram consideradas como sendo uma importante ferramenta para a luta e erradicação da pobreza.

Mas e, apesar dos enormes avanços que o Homem conseguiu nos campos da comunicação e das tecnologias, a maior parte das pessoas continua a viver em condições paupérrimas. Quando olhamos para o mapa relativo à distribuição das Tecnologias da Informação e da Comunicação apercebemo-nos da existência de grandes assimetrias entre o norte e o sul, entre populações urbanas e populações rurais, entre ricos e pobres, entre homens e mulheres, entre aqueles que a elas acedem e aqueles que não têm possibilidade de o fazer. Constata-se, pois uma distribuição desigual das TIC e um défice no acesso à informação entre a maioria da população mundial.

O encontro em Geneva foi uma oportunidade para colocar em evidência tais disparidades e deu a possibilidade, a cada país, de retratar, ainda que em traços gerais, a sua realidade nacional e os desafios enfrentados para se integrarem na “Nova Sociedade”. A partir das declarações prestadas foi possível fazer uma listagem dos principais obstáculos com que muitos países se deparam. Eles são: a grande concentração de população em zonas remotas e rurais, o baixo grau de literacia e o ainda menor grau de literacia nas TIC, a falta de capital financeiro adequado para estimular o progresso económico, a falta de recursos humanos, os elevados custos no acesso às TIC, a inadequada capacidade de absorção e as pobres e insuficientes infraestruturas.

Tendo em conta esta realidade que coloca, muitos países, fora da marcha da Sociedade da Informação, surgiram várias propostas para o desenvolvimento de uma sociedade inclusiva e equalitária.

 

Sommet mondial sur la société de l'information, Genève, décembre 2003  
 Eixo da Tecnologia
   
1. Cooperação Internacional
   
1.1. Cooperação Financeira

Nas declarações prestadas em Geneva pelos diversos representantes dos 150 países aí presentes ganharam- destaque as ideias de que os países sub-desenvolvidos devem mobilizar os meios adequados para se integrarem na sociedade da informação e de que, no plano internacional, é essencial fazer uma redistribuição global dos recursos para evitar a concentração da Sociedade da Informação apenas nos países desenvolvidos.

Assim, a cooperação financeira parece ser um elemento-chave para dar um novo rumo à Sociedade da Informação. Muitos países apelaram à solidariedade internacional como suporte para impulsionar as suas estratégias de integração. Neste sentido, a transferência de capital para o investimento nas TIC, por meio de projectos e programas de ajuda ao desenvolvimento, tomando em conta as necessidades específicas dos seres humanos, foi uma questão muito sublinhada em Geneva. O Fundo de Solidariedade Digital tem sido sugerido, neste contexto, por África e poderá constituir uma nova esperança para os povos africanos.

Propostas também como elementos para impulsionar o desenvolvimento de uma sociedade na qual todos possam aceder, utilizar, partilhar e disseminar informação e conhecimento foram a realização de parcerias entre o sector público e o sector privado e a criação de sinergias entre diferentes sectores e redes, com vista a optimizar os escassos recursos financeiros.

Ainda na questão financeira, os governos ocupam um lugar de destaque. Segundo a opinião de muitos representantes, estes devem ter a responsabilidade de promover um ambiente nacional propício à absorção das TIC e seu respectivo uso, bem como, fomentar o investimento  no sector.

 

1.2. Cooperação técnica e partilha de “savoir-faire”

Muitos destes países enfrentam sérios problemas, tais como, a fome, a malnutrição, a iliteracia, a discriminação contra mulheres, crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiências.

A injecção de capital financeiro nos países subdesenvolvidos não é por si só suficiente para promover a sua integração na Sociedade da Informação e para promover o seu desenvolvimento. Neste sentido, é também vital a cooperação e apoio internacional em áreas relacionadas com a tecnologia, propriamente dita, e a sua aplicação e uso. Em muitas declarações transpareceu a necessidade e a vontade de providenciar aos países em desenvolvimento a transferência de tecnologia, de recursos humanos, de infraestruturas de apoio e  de “training” nas TIC, de forma a que se possa combater certos problemas por estes países sentidos e se consiga integrá-los na Sociedade da Informação.

Um outro elemento a que foi feita alusão várias vezes nas participações dos representantes de cada país foi a questão da troca e partilha de informação e experiência entre países e regiões. Incrementar este processo de troca de modos de “savoir-faire” contribuirá para dar um novo rumo à Sociedade da Informação.

 

2.

Incremento da participação dos cidadãos na governância

As declarações mostraram haver uma grande preocupação com a solidificação de modelos democráticos de governância. A abertura, a transparência e a responsabilidade parecem ser os princípios de base para uma governância democrática das sociedades a todos os níveis (local, nacional e internacional). Sociedades da informação e da comunicação inclusivas, participatórias, onde os corpos governamentais estão comprometidos a envolver todos os cidadãos na governância e nos processos de tomada de decisão foi uma ambição muito referida nas sessões plenárias.

Neste sentido, deve ser reforçado o acesso público à informação produzida ou mantida pelos governos e garantir-se que essa informação está completa e acessível num formato e linguagem que os cidadãos possam perceber. Isto implica, como é óbvio a facilidade de acesso a documentos ou instituições relativos a actividades que são do interesse público, especialmente em situações em que o governo não tornou certas informações públicas.

Por outro lado, as TIC podem igualmente melhorar a eficácia da acção governamental e tornar a administração de determinados serviços públicos mais transparente e mais simplificada ao nível dos procedimentos.

 

 

3.

Criação de mecanismos de segurança global

Parece haver uma preocupação geral, pelos representantes dos países participantes, no que concerne à relação entre as Tecnologias da Informação e da Comunicação e as questões de segurança.

Se por um lado as TIC aproximam povos, tornando mais possível o acesso a informações e facilitando a comunicação, por outro lado, elas podem ser um veículo que coloque em perigo os países e os seus membros. Muitas nações mostram a sua vontade em empenharem-se na luta contra fenómenos como o ciber-crime, a fraude, o terrorismo, a divulgação de informação com conteúdos pornográficos, com ideais que incitem ao ódio e à violência, à toxicodependência, à prostituição, etc.

Colocar em segurança os mercados, os organismos sociais e as pessoas parece ser um dos aspectos prioritários na construção da Sociedade da Informação. Por isso, muitos governantes sugeriram a criação de um mecanismo que controle e que faça a gestão das TIC no que concerne ao aspecto da segurança.

Neste sentido, a internet aparece como um dos instrumentos de informação e de comunicação mais susceptíveis à insegurança. Uma falha poderia resultar num enorme caos da vida pública. Daí que um organismo responsável, exclusivamente pela gestão da Internet tenha sido, também altamente sugerido.

Ainda dentro das questões da segurança global, foi também discutido o tema da protecção dos dados pessoais e da vida privada. O direito à vida privada deve ocupar um lugar de destaque na Sociedade da Informação. Ele deve ser defendido nos espaços públicos, em linha ou não, em casa e nos locais de trabalho. A conservação, a utilização e a comunicação dos dados pessoais deve ficar sob o controlo da pessoa concernante. O poder do sector privado e dos governos sobre os dados pessoais deve ser limitado ao mínimo, respeitando as condições legais claramente explícitas.

 

Sommet mondial sur la société de l'information, Genève, décembre 2003

 

 Eixo da Pessoa Humana

   

4.

Valorização dos aspectos endógenos de cada povo

Entre os temas mais comentados na sessão plenária, a relação entre as tecnologias de informação e comunicação e os aspectos estruturais da cultura e organizações endógenas de cada povo teve, em quase todos os discursos, um lugar de destaque. Os comentários, neste aspecto, conduzem à ideia de que a construção de uma Sociedade da Informação deve assentar na preservação e respeito da diversidade cultural e linguística e ser um veículo que favoreça a divulgação desta mesma diversidade. As TIC desempenham, pois para a obtenção destas finalidades, um papel importante.

No passado o desenvolvimento das TIC levou ao reforço das desigualdades. O uso quase exclusivo uso de línguas baseadas em caracteres romanos (especialmente o inglês) conduziu à marginalização das línguas locais, regionais e minoritárias.

A Sommet fez transparecer que prioridade deve ser dada à pesquisa e desenvolvimento de estratégias para ultrapassar as acções do passado.

 

 

5.

Respeito pela liberdade de expressão e “free flow” de ideias

Também muito sublinhadas como aspectos fundamentais para erguer a sociedade da informação foram as questões ligadas à liberdade de expressão. Nos discursos dominou a ideia central de que todos têm direito a exprimirem livremente as suas opiniões e de acederem à informação, dentro ou fora das fronteiras nacionais.

Esta ambição implica, obviamente a livre circulação de ideias, o pluralismo de fontes de informação, a independência dos media e avaliabilidade das ferramentas de acesso à informação e partilha de conhecimento.

 

Sommet mondial sur la société de l'information, Genève, décembre 2003

 

 2. Repensar a inclusão digital

A exclusão digital não é não estar conectado à internet, não ter um computador, um telefone celular, uma televisão, etc. É sermos incapazes de pensar e criar novas formas, mais justas e equitativas, de produção e distribuição da riqueza simbólica e material.

Falar sobre a inclusão digital pressupõe uma reflexão sobre a ideia de exclusão social. Esta é o resultado de problemas históricos, políticos, sociais e económicos vividos por grande parte dos países, embora as situações mais caóticas estejam localizadas em países pobres e subdesenvolvidos.

O conceito de exclusão surge por volta da década de 90 e vem substituir o conceito de pobreza utilizado até então. Segundo Atkinson o conceito de exclusão social refere-se aos mecanismos através dos quais os indivíduos e grupos são excluídos das trocas, das práticas componentes e dos direitos de integração social e de identidade. Ele estende o conceito mesmo ao nível da participação na vida do trabalho, no campo da habitação, da educação, da saúde e do acesso a serviços.

Tendo como foco o conceito de exclusão social com um olhar centrado nas questões da inclusão não podemos deixar de observar os grandes contrastes sociais existentes nas sociedades da actualidade, em que a maior parte dos recursos[1] estão concentrados nas mãos de uma minoria.

Baseada neste cenário complexo, onde a questão do “excluído social” se faz presente, a discussão sobre a inclusão digital ganha força e nos últimos anos tem-se tornado foco de muitos projectos sociais. Possibilitar o acesso às tecnologias da informação e da comunicação, visando a integração dos indivíduos na sociedade pode ser um meio viável para minimizar os problemas sociais[2] e para integrar o mundo na Sociedade da Informação.

A exclusão digital é um problema complexo que apresenta desafios práticos e políticos. Tem que se ter em conta que as soluções que funcionam nos países desenvolvidos não podem ser simplesmente transferidas para os ambientes dos países em desenvolvimento: as soluções precisam de ser pensadas segundo as necessidades e condições locais.

Por outro lado, propiciar o acesso à tecnologia é essencial, mas é preciso ir além da componente física. Computadores e conexões são insuficientes se a tecnologia não é, efectivamente utilizada, seja porque as pessoas não têm meios económicos para as obter, ou porque não sabem utilizá-la, seja porque a economia local e as políticas governamentais não fomentam o seu uso.

Para a construção de uma Sociedade da Informação mais justa e equitativa creio que terá de se ter em conta três grupos de factores essenciais: a vontade política, o ambiente económico e normativo e as características das populações. Eles fizeram, de certo modo, parte das declarações dos representantes governamentais. Creio que merecem uma discussão um pouco mais aprofundada.

A vontade política

Os governos podem desempenhar um papel fundamental, criando um ambiente que fomente o uso da tecnologia e estimule o investimento nas infra-estruturas de apoio à Sociedade da Informação e o desenvolvimento da capacitação da força de trabalho. A acção governamental também é importante para dar a conhecer os benefícios da tecnologia por toda a sociedade.

Muitos líderes nacionais adoptaram as TIC e estão prontos para promover um ambiente jurídico e normativo que possibilite a expansão da sua utilização. Mas na prática as autoridades governamentais geralmente não entendem as implicações das políticas, pois não conhecem a realidade do país. As lideranças precisam fazer uma estimativa realista do que as Tecnologias da Informação e da Comunicação podem fazer pelo seus país e pelas suas comunidades, e precisam liderar efectivamente e reforçar a confiança pública no rumo que estão seguindo.

 

O ambiente económico e normativo

Do ponto de vista económico é necessário ter em conta os seguintes aspectos: o ambiente económico local é propício ao uso da tecnologia? A tecnologia faz parte do desenvolvimento económico local? O que é que é preciso fazer para integrar a tecnologia nas estratégias de desenvolvimento económico local?

Por outro lado, e ainda do ponto de vista económico, é necessário haver, sobretudo uma associação de recursos. A questão da inclusão social vai além das inciativas isoladas. A cooperação financeira, seja ela regional, nacional ou internacional apresenta-se como um recurso indispensável com vista à inclusão digital. Só com a solidariedade é possível atacar os problemas.

Desta cooperação tem surgido diversos programas com fins lucrativos e que estão expandindo com êxito o acesso à tecnologia para grupos cada vez maiores. Também uma grande variedade de projectos está em andamento nos países em desenvolvimento para integrar as TIC em áreas críticas, como, a educação, a assistência médica, o comércio, o apoio a pequenas empresas, etc.

A questão normativa ocupa, nos esforços da inclusão digital, um papel de grande importância. É necessário avaliar se as leis e regulamentações nacionais limitam o uso da tecnologia; se é necessário proceder a mudanças para criar um ambiente que estimule o uso da tecnologia.

Muitos dos projectos criados deparam-se com obstáculos que estão directa ou indirectamente relacionados com o ambiente normativo do país[3]. Alguns baseiam-se na utilização de tecnologias e de infra-estruturas que podem estar limitadas pela legislação e regulamentação em vigor, como leis que controlam e proíbem, por exemplo, o uso do satélite e da tecnologia sem fio. Existem outros projectos que podem ser obstruídos pela legislação ou regulamentação geral, como políticas fiscais e aduaneiras que limitam o comércio das tecnologias de informática através das fronteiras. Outro exemplo de projectos que encontram sérias dificuldades de implementação devido à questão normativa são os projectos voltados para a assistência médica, onde as leis da privacidade e protecção de dados médicos impedem o uso das TIC.

As características das populações

É importante salientar que a sociedade como um todo é a peça chave do processo de inclusão digital. As características, as capacidades e as potencialidades que ela apresenta vão determinar fortemente o grau de aceitação e integração das Tecnologias da Informação e da Comunicação no seu quotidiano. Todo o backgorund da sociedade, esta entendida como um organismo vivo e dinâmico, pautado pela transformação permanente, vai determinar o uso efectivo das TIC.

Neste ponto de vista, a relação entre o Homem e a Tecnologia é um processo bilateral. Se, por um lado, as Tecnologias da Informação e da Comunicação têm de ir ao encontro das necessidades e das características específicas dos indivíduos, por outro, estes transformarão as suas práticas quotidianas a vários níveis em virtude do uso  de novas formas de informação e de comunicação.

Por este motivo, as TIC não podem ser concebidas e introduzidas em contextos sociais, culturais e económicos que não têm a capacidade, por múltiplos factores, de as absorver convenientemente.

Os organismos responsáveis pela luta da inclusão digital têm de avaliar se a população tem a capacidade e os conhecimentos necessários para o uso efectivo da tecnologia e se é capaz de avaliar o seu potencial.

É também indispensável que a tecnologia disponível seja adequada às necessidades e condições locais da população. Qual é a tecnologia adequada considerando o que as pessoas precisam e como querem usá-la?

Além destes aspectos uma sociedade da informação inclusiva só pode ser possível se os conteúdos informacionais estiverem disponíveis num formato e numa linguagem especifícos, se o acesso à tecnologia estiver a um preço razoável e ajustado à economia e às possibilidades de cada país e a sua população.

Um outro aspecto que queria ainda focar e que considero ser de grande interesse é a questão da literacia. Trata-se de um assunto que também foi muito falado na conferência em Geneva. Muitos países em desenvolvimento comprometeram-se mesmo, a trabalhar para fazerem aumentar os níveis de literacia dentro das suas fronteiras. O uso das TIC e a literacia estão em muito relacionados, uma vez que o uso de alguns instrumentos de informação e de comunicação[4] pressupõe, à partida, a posse de um determinado capital cultural.

Neste sentido, a aquisição de literacia não é apenas uma questão de educação, mas também uma questão de poder. Um indivíduo que possui as características requeridas para aceder a determinados meios de informação e comunicação, é um indivíduo que, à partida, possui mais poder[5] ou uma mais-valia do que um outro que não reúne estas mesmas características. Daí deverá englobar nas estratégias nacionais, a preocupação pela literacia, de modo a que esta, em conjunto com outros factores já anteriormente descritos, possa contribuir para termos pessoas mais informados, mais participantes nos assuntos políticos e de tomada de decisão, mais capazes de resolver determinados problemas; enfim pessoas mais incluídas na Sociedade da Informação.

Para superar a exclusão digital e pôr as TIC efectivamente ao serviço da melhoria de vida das pessoas, dos países e das comunidades, precisamos que os governos (a vontade política) se abra aos benefícios das TIC e aceite integrar no quadro nacional os projectos que vão neste sentido, pondo de parte certos entraves; precisamos de uma estrutura jurídica e normativa que estimule o uso das TIC; e precisamos de pessoas capazes de as utilizarem e de entenderem o seu potencial e as vantagens que podem trazer. Se quisermos reduzir a exclusão digital, essas questões precisam de ser tratadas por meio de uma estratégia coerente e viável.

 

Sommet mondial sur la société de l'information, Genève, décembre 2003

 

 Conclusão

Muitas são as esperanças depositadas nas TIC para a resolução dos problemas sociais que atingem uma grande massa da população mundial, como a pobreza e o sub-desenvolvimento. Elas não são por si só uma solução, mas indubitavelmente são indispensáveis para construir novas formas de luta contra esses problemas.

Aqueles que popularizaram o termo de “digital divide” ajudaram a focar a atenção do público em geral nas questões da tecnologia e da desigualdade. É já altura de consciencializar a sociedade para a compreensão do que o acesso às TIC pode trazer de positivo e de benéfico para a vida das pessoas.

As TIC são recursos de capital físico que se apresentam como forças produtivas para o desenvolvimento das capacidades de funcionamento que favorecem a produção de capital social, humano e simbólico. A existência de um sólido capital aumenta as possibilidades de intervenção e de acesso aos benefícios públicos.

As políticas públicas e sociais devem, então promover as TIC como recursos públicos para o acesso à criação e apropriação social de todas as formas de capital (tendência que se acentua eminentemente em círculos privados e já por si próprios ricos em recursos e capital). Estas políticas favorecem o desenvolvimento sustentado da sociedade civil.

É de salutar o facto de já se ver o despontar, por parte da sociedade civil e da vontade política, uma preocupação em integrar a tecnologia nas estratégias de desenvolvimento. Creio, contudo que ainda estamos na fase embrionária deste processo.  As Tecnologias da Informação e da Comunicação estão ainda concentradas nas mãos de uma minoria, enquanto que uma massa imensa de gente ainda não conhece os benefícios das mesmas e a elas jamais acedeu.

Há um longo e complexo caminho a percorrer. É necessário definir estratégias adequadas às necessidades e às características das comunidades. Não se pode implantar estratégias modelo em todas as partes do globo, dada a grande variedade de padrões sociais e culturais que definem cada povo. Há que haver um entendimento prévio das formas de organização de um povo e só depois se definir estratégias. É aí que reside, sobretudo a complexidade do processo de integração das TIC.

 

 

Notes

[1] Aqui o conceito de recurso refere-se a formas de capital que proporcionam uma mais-valia, uma vantagem no acesso a determinados benefícios. Este capital pode revestir-se de conteúdo económico e de conteúdo social (entendido, por exemplo, como a detenção de uma certa capacidade de influência ou de uma extensa rede de solidariedade que favorece a movimentação no campo social).

[2] Problemas como o desemprego, a pobreza, os baixos níveis de literacia e mesmo as elevadas taxas de analfabetismo.

[3] Ambiente este que reflecte o próprio contexto político do país.

[4] e as vantagens que este uso e acesso fornecem ao indivíduo que está em contacto com estes instrumentos.

[5] Aqui o poder é entendido como a capacidade de aceder às Tecnologias da Informação e da Comunicação e delas poder tirar partido para proveito próprio. Quanto mais possibilidades de acesso às mesmas um indivíduo possuir, e delas fizer efectivamente uso, mais poder ele detém.

 


 

 

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